Alguns minutos de sono podem trazer benefícios para a memória, o bem-estar e a produtividade no trabalho
Mesmo em tempos de guerra, com bombas caindo sobre sua cabeça, Winston Churchill não abria mão de tirar uma soneca no meio da tarde. Às 17 horas em ponto, hora do chá (que ele não apreciava muito), o primeiro-ministro do Reino Unido parava tudo para dormir um pouquinho. Acordava, tomava banho, comia alguma coisa, bebia também, e voltava a trabalhar incessantemente até a 1 da manhã. “Quem adere ao hábito ganha dois dias em vez de um”, costumava dizer. No Brasil, um dos grandes propagadores do sono vespertino é o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Ele cochilava por quinze a vinte minutos em um dos sofás do Palácio da Alvorada, em Brasília. “Faz um bem danado”, disse em 1998. Por acaso ou não, Churchill viveu até os 90 anos. FHC está firme, forte e lúcido aos 89.
A ciência acaba de ratificar o papel essencial da sesta para o metabolismo. O mais recente trabalho sobre o assunto, publicado na revista científica americana General Psychiatry, mostrou que deitar um pouquinho que seja durante o dia melhora a capacidade cognitiva (percepção, memória, juízo e raciocínio). Os pesquisadores avaliaram os padrões de sono de 2 214 pessoas saudáveis com 60 anos ou mais. Destas, 1 534 tinham o hábito de tirar uma soneca vespertina regular, enquanto 680 não. Todas foram submetidas a testes para rastreamento de demências e funções cerebrais. O grupo do cochilo apresentou pontuações mais altas na consciência, fluência verbal e memória, em comparação com os demais. O benefício se estende para os mais jovens. Estudo anterior, conduzido pela agência espacial americana, a Nasa, demonstrou que homens e mulheres de diversas faixas etárias que repousavam por aproximadamente vinte minutos depois do almoço têm a capacidade de raciocínio e memória aumentada em 34%, além da habilidade para tomar decisões estimulada em 54%.
A explicação é simples. “O sono curto dá um rápido combustível para ficarmos ativos”, diz a biomédica Monica Andersen, diretora do Instituto do Sono: “É como se ele restaurasse as funções cerebrais que foram utilizadas até então”. Para fazer bem, no entanto, um cochilo tem de ser um cochilo mesmo, breve. Ou seja, não pode durar muito. Diz a bióloga Claudia Moreno, vice-presidente da Associação Brasileira do Sono: “O tempo ideal é de até trinta minutos”. Mais do que isso, pode roubar o sono da noite, esse, sim, com a função de restabelecer o organismo por completo.
A soneca é tão antiga quanto os romanos, que amavam a chamada “sexta hora” — um rápido sono na sexta hora do dia, depois do amanhecer, por volta do meio-dia. Foi daí que surgiu a expressão “sesta”. Até a invenção da lâmpada elétrica, no século XIX, os adultos costumavam dormir em duas etapas, uma durante o dia, outra à noite. A luz artificial permitiu às fábricas manter os funcionários no trabalho por mais horas e eles passaram a voltar para casa só à noite para dormir. Os novos conhecimentos agora deflagraram um movimento inverso. Tem se tornado cada vez mais comum grandes corporações estimularem a soneca entre seus funcionários em pleno expediente de trabalho. Empresas como Uber, Google, Facebook, Nike e Mercedes-Benz instalaram espaços dedicados para rápidos descansos em suas sedes, visando aumentar a produtividade e a criatividade dos funcionários. “Nenhum local de trabalho está completo sem um cochilo”, disse David Radcliffe, vice-presidente de serviços imobiliários e locais de trabalho do Google. De fato, ninguém mais dorme no ponto.
Publicado em VEJA de 3 de março de 2021, edição nº 2727